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Do chão de fábrica à administração. Onde as mulheres estão?

Foto do escritor:  Luana Kristina de Jesus Nunes Luana Kristina de Jesus Nunes
Luana Kristina de Jesus Nunes
Graduanda do Bacharelado em Administração Pública no Instituto de Ciências Humanas e Sociais (UFF - Volta Redonda) e Pesquisadora Associada ao Brazilian Research in Auto Industry (Brain).

Currículo Lattes: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do

Historicamente, esbarramos com questões de gênero no mercado formal que, dentro das variações de tempo e espaço, se associam com a separação desigual das tarefas domésticas entre os sexos. Nas primeiras aparições do termo ‘divisão sexual do trabalho’ na França, impulsionado pelo movimento feminista, buscava-se denunciar as desigualdades e repensar o “trabalho”. Essa distribuição assimétrica de poder é de gênero, mas um fator que estrutura a relação hierárquica entre homens e mulheres, pois historicamente foi atribuído o papel produtivo aos homens e o reprodutivo às mulheres. O nosso recorte busca entender como essas questões se dão no setor automotivo, com um mercado de trabalho cada vez mais excludente e competitivo.

A indústria automotiva expressa essa desigualdade entre gêneros através do número discrepante de contratações e da diferença salarial, por isso se destaca como um dos setores produtivos com maior presença masculina na economia brasileira. Desde a abertura das primeiras plantas até hoje, os homens representam a maioria dos empregados do setor, do chão de fábrica à administração. Apesar disso, as empresas procuram transparecer um perfil que demonstra diversidade, embora os números mostrem que, desde 2017, a participação feminina no setor não mudou, permanecendo em torno de 20%, segundo pesquisa do Automotive Business. Mas se as empresas objetivam vender a todos em prol da diversidade da clientela, porque seu quadro de funcionários não reflete isso?

O funil hierárquico do setor demonstra que nos cargos de aprendiz e traineesexiste uma maior equidade de gênero nos números. Entretanto, o cenário muda a partir do quadro funcional, gerencial, de direção e presidência, revelando diferenças alarmantes entre os sexos. O setor interage sob concepções de gênero enraizadas. Dessa forma a divisão sexual do trabalho na fábrica é extensão da divisão de funções entreposta e estagnada no âmbito doméstico e na sociedade em geral. A diferenciação na ocupação dos cargos pode ser explicada por dois princípios organizadores: de separação ou hierárquico. O primeiro nos diz que existem tarefas designadas de formas diferentes entre homens e mulheres, já o segundo foca na diferenciação salarial, em que se considera que o trabalho de um homem “vale” mais. Esses princípios na prática, tomando como base a indústria automotiva, direcionam o trabalho feminino para o setor administrativo, ocupando postos relacionados ao cuidado, à atenção, entre a outras tarefas associadas a noções de delicadeza.

A discussão de gênero com a inserção feminina na vida pública é fruto dos avanços feministas, mas situações como a diferenciação salarial podem estar relacionadas ao machismo enraizado que persiste, principalmente, no momento da contratação, que tende a admitir pelos motivos mais diversos e pagar salários inferiores. O mercado é segmentado e apresenta “guetos ocupacionais”, nos quais os estereótipos femininos são manipulados e estimulados na esfera privada como uma fórmula de sucesso para manter esses padrões.

No setor automotivo, vemos um perfil de trabalhadores jovens por conta do dinamismo e do desempenho no trabalho e por possuírem maior vigor físico. As mulheres se encontram nos chamados “guetos” - e dentro desse recorte, é possível se aprofundar nas desigualdades, pois aqui elas não se encontram na mesma situação, pois as negras enfrentam ainda mais desafios, com cargos inferiores e desvalorizados, com falta de oportunidades para escolarização e acesso - devido à falta de estímulos para atuação em áreas tecnológicas.

Outra questão importante a ser destacada é a permanência da dupla jornada vivenciada pelas mulheres. O modelo de organização familiar relacionado à divisão sexual do trabalho - mesmo considerando as diferentes classes sociais, as diferenças entre países, culturas e décadas - na qual a realidade de inúmeras famílias é representada por meio da domesticidade das mulheres e da sua exclusão formal e informal desse mercado. Nesse sentido, é necessário salientar que o tempo, entendido como um recurso de valor ou um capital, é também desigual e deve ser lembrado entre as relações de gênero e na divisão sexual do trabalho. Resgatando o que foi mencionado anteriormente, o papel produtivo direcionado aos homens e reprodutivo às mulheres teve sua distinção sustentada na concepção tradicional da separação das funções, o que nos mostra que a distribuição de tempo na sociedade industrial é pautada na diferenciação dos gêneros.

Com a inserção das mulheres nos mercados formal e informal de trabalho, observou-se a conciliação entre as esferas produtivas e reprodutivas, sendo necessária a vivência em duplas jornadas, ou a acumulação de tarefas. Desse modo, é visível no setor a permanência de vícios como avaliações orientadas pelos padrões masculinos, por relações pessoais ou simplesmente o tempo de conciliação entre o produtivo e reprodutivo. Esse foi o modelo adotado e que, com as mudanças nas organizações do trabalho e competitividade, atinge homens e mulheres, mas, infelizmente, não da mesma forma. Os cargos administrativos, dentro do escritório, são ocupados por mulheres, e se mantêm atrelados às “qualidades” ditas femininas mencionadas anteriormente, sendo relevante o fato de que esses são os espaços estratégicos para a lógica do capital.



 
 
 

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